A Câmara dos Deputados aprovou, na madrugada desta quarta-feira (17), o Projeto de Lei 2.159/2021, que flexibiliza o licenciamento ambiental no Brasil. O texto, que já havia sido aprovado pelo Senado, agora segue para sanção ou veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Organizações ambientais e da sociedade civil alertam que a medida representa um retrocesso sem precedentes na política ambiental brasileira e contraria compromissos internacionais assumidos pelo país.
A proposta altera de forma estrutural a legislação ambiental construída ao longo das últimas quatro décadas. Entre as mudanças, estão a possibilidade de autolicenciamento por parte dos próprios empreendedores, a dispensa de avaliação técnica para projetos de alto impacto, como estradas e barragens, e a regularização de áreas desmatadas ilegalmente, inclusive em terras públicas. O texto também flexibiliza normas de proteção em Áreas de Preservação Permanente (APPs), como encostas e margens de rios.
Segundo o coordenador de biodiversidade do Instituto Ampara Animal, Filipe Reis, a medida compromete diretamente a conservação da fauna silvestre. “Ao excluir a exigência de estudos técnicos, como o Estudo de Impacto Ambiental (EIA), para vários empreendimentos, deixa-se de analisar impactos e mapear corredores ecológicos e áreas prioritárias para conservação. Isso pode gerar fragmentação de habitats, isolamento de populações e aumento da mortalidade de animais terrestres e aquáticos”, afirma.
Reis ressalta ainda que os efeitos dessa flexibilização já foram observados em desastres como os rompimentos das barragens em Mariana e Brumadinho, ocorridos em contextos de enfraquecimento do licenciamento ambiental estadual. “Agora, essa lógica será nacionalizada. O projeto ignora a complexidade dos ecossistemas e enfraquece a prevenção de riscos”, conclui.
A presidente do Instituto Líbio, Raquel Machado, afirma que “autorizar empreendimentos com base em autodeclaração, sem análise técnica, significa transferir o risco ambiental para as populações e ecossistemas. O licenciamento não é um entrave ao desenvolvimento, mas uma garantia mínima de proteção ambiental”.
Já Ana Paula Vasconcelos, diretora jurídica do Fórum Nacional de Proteção Animal, observa que a nova legislação reduz os mecanismos de controle e fiscalização e ameaça os compromissos internacionais do país. “O PL desconsidera o papel da sociedade na gestão ambiental e enfraquece as obrigações assumidas no Acordo de Paris, incluindo as metas de redução de emissões e proteção da biodiversidade”, diz.
A aprovação do projeto ocorre em um momento de atenção internacional ao Brasil, que sediará a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), marcada para novembro deste ano, em Belém (PA). A COP30 deverá reunir chefes de Estado, organizações multilaterais e movimentos sociais para discutir estratégias de enfrentamento à crise climática. Para as organizações ambientais, a sanção do PL neste contexto sinalizaria contradição entre o discurso do governo brasileiro e a prática legislativa.
“A realização da COP30 no Brasil deveria reforçar o compromisso com o fortalecimento das políticas ambientais e climáticas. A aprovação do PL 2.159/2021 caminha no sentido oposto, ao reduzir a capacidade do Estado de avaliar, controlar e mitigar os impactos ambientais de grandes empreendimentos”, afirma Ana Paula Vasconcelos.
Os biomas brasileiros mais vulneráveis — como a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal —, que já enfrentam recordes de desmatamento, poderão ser ainda mais pressionados com a implementação do novo modelo de licenciamento. A segurança hídrica de milhões de brasileiros também pode ser comprometida pela ocupação desordenada de áreas sensíveis.
Diante do cenário, as organizações pedem que o presidente Lula vete o projeto e convoque uma nova rodada de diálogo técnico e participativo para discutir alternativas que assegurem tanto a proteção ambiental quanto a previsibilidade para empreendimentos, sem abrir mão da responsabilidade socioambiental.
Valle da Mídia
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